A Louca

02/04/2012 13:33

 

Tadeus estava com dor de cabeça, abriu a gaveta da mesa de trabalho e pegou um comprimido, um não adiantaria, pensou, pegou dois e guardou novamente o frasco na gaveta. A dor de cabeça não iria passar enquanto não resolvesse a série de homicídios em que estava trabalhando.

Ele se achava uma pessoa inteligente, tinha um raciocínio lógico e rápido, o que o ajudou a conquistar privilégios bem cedo e o cargo de investigador. Todos os casos em que trabalhou foram solucionados rapidamente, mas essa série de homicídios estava rendendo muitas manchetes aos jornais e pouca credibilidade à polícia.

A polícia estava desorientada, não tinha a mínima ideia de um possível culpado, nem uma pequena pista para seguir. Se ele era inteligente estava começando a achar que o criminoso era muito mais, não deixava digitais e até agora não encontraram nenhuma testemunha.

Quando acharam a primeira vítima, um homem de quarenta anos, bonito e em boa forma física, o crime fora passado para a mídia como um assalto em que a vítima possivelmente reagira. Só a polícia sabia das peculiaridades do crime, mas para investigador o caso melhor era necessário que os dados não fossem revelados. Mas quando encontram a terceira vítima não foi mais possível esconder e agora a cidade estava em clima de tensão, já estavam na sexta vítima.

As vítimas eram todos homens de quarenta anos, de classe média alta, todos eles frequentavam academias e se cuidavam muito bem. Eram encontrados com as mãos e os pés amarrados, mortos com uma facada certeira no coração e tinham o órgão genital amputado. O órgão de nenhuma vítima fora encontrada e por mais asqueroso que se pensasse, parecia que o criminoso levava-os como suvenir. Foi encontrado vestígios de soníferos no organismo de todas as vítimas.

Que distúrbio faria uma pessoa fazer isso com outra pessoa? Um psiquiatra forense fora chamado para fazer um perfil do criminoso e chegou à conclusão que era uma mulher, só podia ser muito bonita, para atrair facilmente os homens, de vinte cinco a trinta e cinco anos e que pelo jeito que tratava suas vítimas, tinha problemas com a própria sexualidade.

Ele achava que se fosse realmente uma mulher, ela era apenas louca, uma louca que estava lhe dando nos nervos e que por ele iria para um hospício pelo resto de sua vida.

Estava muito cansado e já estava muito tarde, na delegacia só estavam os plantonistas e a noite estava razoavelmente calma, não havia muitas ocorrências. Trabalhara mais no final de semana que na semana inteira, o último corpo tinha sido encontrado na manhã de sábado e agora no domingo às oito da noite, só pensava em ir para casa tomar um banho. Na segunda feira provavelmente teria uma dor de cabeça terrível, teria que fazer um relatório para o delegado e não tinha ideia do que colocaria no relatório, não tinha nada para relatar.

Estava com saudades da mulher, fazia dias que não ficavam juntos, mulher de policial tem que se acostumar com isso, mas ele mesmo sentia falta da sua casa. Apesar de tudo o que estava passando com esse caso, amava a sua profissão e queria resolvê-lo logo, estava ficando pessoal, podia ver o criminoso rindo do departamento de polícia, mas especialmente dele. Seis vítimas era um absurdo ter chegado a esse número sem nenhuma pista e se o psiquiatra estivesse certo e fosse realmente uma mulher, ele estava muito admirado pela sua audácia e inteligência. Tadeus era um membro vitalício do clube dos machistas que ainda achava que mulheres eram inferiores aos homens.

Pegou seu paletó na cadeira, apagou a luz de sua sala e foi embora para casa. Foi caminhando, havia deixado o carro com a esposa e a delegacia não era assim tão distante de sua casa, seria bom voltar caminhando e pensando no caso mais um pouco. Pensava em como seria difícil para as famílias das vítimas perderem seus entes nas mãos de uma pessoa desequilibrada, homens com quarenta anos, com uma carreira já estabilizada. No momento seguinte se deu conta que ele era um candidato perfeito, pois completara quarenta anos na semana anterior, a esposa vivia dizendo que era muito bonito e podia-se dizer que sua carreira estava estabilizada. Sorriu, com o pensamento.

Chegando à sua casa, sua esposa estava acabando o jantar e ficou muito feliz ao vê-lo.

- Que bom que você conseguiu vir jantar em casa, estava com saudades. – Disse ela

Ele a abraçou e deu um beijo, amava muito a mulher, era a pessoa mais calma, mais compreensiva e mais pacata que conhecia. Só se preocupava com seus afazeres domésticos e quando Tadeus chegava em casa,  perguntava sobre o seu serviço por pura cordialidade, Tadeus sabia que ela não prestava atenção em uma só palavra. Ela se chamava Suzana.

- Essa criminosa está me deixando maluco. Com uma mulher pode pensar em dar tanta dor de cabeça para as pessoas. Quem dera todas as mulheres fossem como você, querida. – Desabafou Tadeus.

Suzana deu um sorriso, foi até a cozinha tirar o assado do forno. Tadeus continuou o desabafo.

- Às vezes acho que algumas mulheres não sabem o seu devido lugar na sociedade. Esse negócio de trabalhar fora de casa sobe à cabeça de algumas até acontecer isso. Ficam totalmente loucas. – Disse ele,

- Querido, você acha que uma mulher seria capaz de fazer tal coisa? – Perguntou Suzana

- No começo eu achava que era trabalho de um louco, todas as vítimas são homens fortes, mas o psiquiatra tem certeza absoluta que é uma mulher e ele é o especialista. – Disse ele com desdém.

Suzana acabara de colocar a mesa e os dois sentaram-se para jantar. Tadeus estava muito irritado e não conseguia esconder que achava que a assassina o estava fazendo de palhaço.

- Quando conseguirmos captura-la, vamos colocá-la no seu devido lugar. – Disse ele.

Suzana que estava com um garfo em direção à boca, parou no meio do caminho, colocou a colher de volta ao prato e foi até a cozinha. Voltou com duas taças de vinho.

-Que tal um vinho para relaxar, você está precisando. - Disse entregando a taça para o marido.

- Querida, você é sem sombra de dúvida a melhor mulher do mundo. – Disse Tadeus aceitando o copo e bebendo o vinho quase todo de uma vez.

Suzana depositou sua taça na mesa e ficou observando o marido. Tadeus continuava discursando sobre a criminosa, sua decepção de não conseguir pegá-la transparecendo em sua voz, em cada palavra que falava. Depois de um tempo Suzana começou a notar que ele estava falando enrolado e seus olhos estavam se fechando devagar. Assim que ele adormeceu na mesa mesmo, Suzana pegou as taças de vinhos, a sua ainda intacta e as levou para a cozinha, quebrou a taça em que o marido havia bebido, enrolou a num jornal e jogou-a no lixo. Jogou o vinho de sua taça fora, lavou e guardou novamente.

Não era sua intenção fazer aquilo, não com o marido, mas o machista pretencioso a tirara do sério com aquele velho discurso de como as mulheres tem que se submeter aos homens. Olhou Tadeus deitado na mesa, daria trabalho leva-lo dali, mas Suzana conseguiria. O marido era tão pretencioso que não sabia nada da vida da mulher, de como ela passava os seus dias. Com certeza pensava que ela ficava o dia inteiro cuidando da casa e fazendo tricô, miserável, babaca antiquado.  

A polícia iria achar estranho um corpo ser encontrado logo após o outro, era sempre um por mês, mas enfim, eles que se preocupassem com isso, agora ela tinha trabalho a fazer. Foi até o carro, verificou se tudo o que precisava estava no porta-malas, voltou para dentro de casa para pegar o marido. Ele estava só dormindo por enquanto, mas mesmo assim seria um peso morto. Sorte sua a garagem ser toda fechada, nenhum vizinha conseguiria vê-la arrastando o corpo do marido até o carro.

Colocou as luvas, pegou a faca que costuma usar, o marido tinha lhe dado de presente, enfiou no peito de Tadeus com toda a força e ficou observando-o por um momento. Retirou a faca do peito e com um golpe retirou o pênis do marido. Quem dá uma faca de presente para a esposa, pensara Suzana quando desembrulhou o presente que o marido lhe dera no aniversário de casamento. Ele devia ter sido a primeira vítima, pensou ela.

Pegou o membro e foi até o freezer que mantinham na área de serviço. Tadeus era tão desligado das atividades da casa, que nem notara que o freezer estava funcionado há seis meses e lá estavam seus troféus. Abriu o freezer e ficou observando todos os seis pênis congelados envoltos em plástico. Pegou um plástico, enrolou o de Tadeus e fechou o freezer.

Todos eles eram canalhas casados que só queria saber de se dar bem com uma mulher fora de casa. Em todos os lugares encontrava um, na academia, no supermercado, em qualquer lugar, eram facilmente manipulados. Fora fácil escolher cada um e colocar o seu plano em prática. Todos eles a lembravam o pai, sempre traindo sua mãe e colocando a felicidade da família em último lugar.

Saiu de seus devaneios, mais um pouco e poderia sair para jogar o corpo fora e na manhã seguinte teria que ligar para a delegacia, perguntado sobre Tadeus. Teria que chorar muito e ainda preparar um velório e um enterro naquela semana, seria uma semana tumultuada. Um vinho iria bem depois que voltasse.

***FIM***


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